Se tem um tema recorrente entre os designers hoje, este tema é o plágio - principalmente quando o assunto é design de marca.
É indiscutível que o volume de imagens disponíveis online facilite a vida de alguns mal-intencionados e que por isso haja sim muito plágio acontecendo, mas com certeza é muito menos do que se promove.
A impressão que tenho é que a cada 10 marcas publicadas nas redes sociais, 11 são acusadas de plágio. Para piorar, essas acusações dificilmente são feitas diretamente para o suposto plagiador, mas compartilhadas publicamente e normalmente utilizando tons desnecessariamente agressivos. Parece que hoje nenhuma opinião é pessoal, todas devem ser públicas e necessitam de aceitação em massa.
Isso muitas vezes pode ter consequências desastrosas pois, neste caso, o que poderia ser uma conversa saudável entre duas partes pode se tornar uma espécie de motim e destruir a carreira de um bom profissional por um erro, deslize, ou pior, por nada.
Não sou especialista em questões legais de registro de marca ou propriedade intelectual, por isso decidi estudar o assunto de forma abrangente antes de fechar uma opinião sobre o ponto de vista do design gráfico.
Este artigo é o resultado deste estudo, portanto, sinta-se livre para tirar suas próprias conclusões.
O conceito de descobertas múltiplas
É totalmente possível que duas ou mais pessoas tenham a mesma ideia, ao mesmo tempo, sem que uma tenha conhecimento da existência da outra.
O conceito de descobertas múltiplas defende a hipótese de que sempre que alguém tem uma grande ideia, provavelmente há outra pessoa no mesmo caminho.
Um dos casos mais conhecidos entre nós, brasileiros, é o de Santos Dumont e os irmãos Wright. Quem inventou o avião, afinal?
Provavelmente os três. A única diferença entre Santos Dumont e os irmãos Wright, ao que tudo indica, é que o brasileiro fez seus testes para o público, enquanto os Wright apresentavam seus vôos na presença de poucas pessoas. Outros nomes, como Otto Lilienthal e Percy Pilcher estavam no mesmo caminho e já vinham tentando construir uma máquina voadora antes mesmo do trio.
Isaac Newton, inglês, e Gottfried Lebniz, alemão, inventaram o cálculo praticamente ao mesmo tempo, por volta de 1684.
Charles Darwin propôs a teoria de evolução praticamente ao mesmo tempo que Alfred Russel Wallace. Ambos eram britânicos.
Toda criação requer influência
“Copiar, transformar e combinar” é um padrão presente na evolução das espécies, evolução social e também na criatividade.
Tudo que você cria é inspirado em alguma coisa, e por mais que você tente não terá como fugir. Isso pode explicar o fenômeno das descobertas múltiplas, pois por mais que você crie algo com base nas suas próprias experiências, estas experiências são construídas com base em materiais, referências e necessidades que se estendem para outras pessoas.
Você provavelmente já ouviu a história de que a Apple copiou designs criados pela Braun nas décadas de 60 e 70. Não encontrei nenhuma confirmação sobre esta afirmativa e não acho que isso se caracterize como cópia ou plágio, mas acho bastante provável que a Braun tenha servido como inspiração para a Apple.
Quentin Tarantino é conhecido por fazer referências não somente a vários gêneros de filmes, mas também a cenários, músicas e até mesmo figurinos utilizados em outros filmes.
George Lucas se inspirou e utilizou diversas cenas de outros filmes como template para criar personagens e cenas de Star Wars.
(Spoilers) Entre 2014 e 2015 assisti a pelo menos 3 filmes que falam sobre transferência da consciência humana para um computador: Lucy, Transcendence e Chappie.
Os longos períodos de produção de um filme e a proximidade entre os lançamentos indicam que dificilmente um poderia ser cópia do outro. Provavelmente são apenas criações que sofreram as mesmas influências.
Simplicidade x Semelhança x Plágio
Todo designer aprende que quanto mais simples, melhor. Por mais que haja controvérsias ou interpretações distorcidas sobre isso, é fato que muitos designers buscam formas cada vez mais simples nas criações de suas marcas.
Imagine que você, designer, precisa criar uma marca cujo conceito é casa. Qual o primeiro símbolo que lhe vem em mente?
Uma casa, certo?
Por mais básica ou inautêntica que esta ideia possa parecer, muitos designers pensariam nesta mesma solução. Será que em nenhum momento estas soluções teriam similaridades sem que uma seja necessariamente plágio intencional da outra?
Agora imagine que o designer, em uma busca por simplicidade e abstração, simplifique o desenho para a forma mais básica possível e o resultado seja a imagem abaixo.
Este símbolo é tão comum e abrangente que em teoria pode ser facilmente plagiado, mas será que a marca se resume a este símbolo?
Deixando de lado as questões de registro legal do desenho da marca, o fato é que marca é muito mais que um símbolo. É comportamento, posicionamento, conceito e entre várias outras características é representada também pelo seu design através da assinatura visual (símbolo e/ou logotipo) e uma identidade visual.
Apesar do registro de marca não levar em consideração todas as manifestações visuais da marca, e eu acho que deveria, é nesse comportamento que marcas com símbolos relativamente comuns se diferenciam.
A Moving Brands criou o projeto de marca e identidade visual para uma startup indiana chamada Housing. O resultado você confere abaixo:
Clique aqui para conferir o projeto completo no site da Moving Brands.
Pergunto:
- Será que estamos todos proibidos de criar uma assinatura visual cujo símbolo é uma seta para cima?
- Será que uma seta para cima é algo simples demais para ser usado como símbolo?
Abaixo cito o designer de marcas Guilherme Sebastiany, em uma entrevista feita para o site LOGOBR:
"... a adoção de um símbolo original e distintivo pode ser parte da solução, porém novamente sua criação não pode ser apenas “estética”. A originalidade nestes casos deve sempre ser estabelecida frente ao tema do segmento. Por exemplo, nas áreas de importação e exportação, trading, e comércio exterior, são comuns as marcas com círculos, globos terrestres e setas. Mesmo com um desenho original de um globo, por exemplo, a proteção no segmento será limitada, pois o tema é comum. Se o nome for genérico será importante romper com o tema do segmento, se o objetivo do projeto envolver a proteção da marca contra concorrentes parasitas. Para conhecer o tema ou os temas de cada segmento, o designer deve fazer sempre uma pesquisa ampla de linguagem de categoria antes de começar o desenho, até mesmo para evitar que a marca que está criando seja ela mesma acusada de parasitagem ou plágio.
O exemplo acima, do símbolo de uma marca, é emblemático e comum, mas a proteção através da criação não se limita a ele. Em cada uma das partes da marca: nome, cores, formas, ícones, tipografia etc, a arma de proteção é sempre a personalização. Embora a originalidade em si não deva ser o objetivo de um projeto, e o rompimento com o segmento tampouco a única premissa de criação, quando há originalidade evidente em um projeto ela pode ajudar a comprovar a má-fé dos imitadores, seja na combinação de cores, grafismos, formas e desenho das letras."
Minha opinião
Acredito que não basta simplesmente fazer uma pesquisa por imagens similares, como vejo muitos aconselhando. O plágio, como o Guilherme Sebastiany deixou claro, não se caracteriza apenas pela forma do símbolo em si, mas por várias outras características, como o desenho do logotipo, cores, área de atuação, etc.
Também acho que apesar de formas simples estarem mais propensas ao risco de plágio, isso não significa que todo símbolo que possua uma forma simples seja cópia ou represente falta de criatividade.
Por isso, por mais que você tenha certeza que testemunhou um plágio, não acuse publicamente o suposto plagiador. Caso tenha sido você a vítima, entre em contato direto com a pessoa e tente resolver pacificamente. Tudo pode não se passar de um erro de interpretação.
Este artigo foi escrito com base em experiências pessoais somadas ao conhecimento construído com a ajuda das referências listadas abaixo:
Canal Piloto: Santos Dumont x Irmãos Wright: afinal, quem inventou o avião?
Everything is a Remix: Séries 1, 2, 3 e 4.
LOGOBR: Registro de marcas: as leis e o design
Matheus Moura: O plágio da ingenuidade
Rudinei Modezejewski: Você é um designer pirata?
Imagens usadas
Alfred Russel: Wikipedia
Apple IMac: Mac Daily News
Apple Ipod: Artblard
Braun T3 Pocket: Phaidon
Braun LE1 Speaker: Lamula
Bruce Lee e Kill Bill: Fanpop e Cinema Uol
Capa: The Noun Project
Charles Darwin: Wikipedia
Chappie: Wikipedia - Chappie
Darwing's Pigeons: Mun
Gottfried Wilhelm: Wikipedia
Irmãos Wright: Wikipedia
Isaac Newton: Wikipedia
Lucy: Wikipedia - Lucy
Santos Dumont e 14-bis: Wikipedia
Star Wars e similares: Everything is a Remix (Part 2)
Thomas Edison: Ciências e Tecnologia
Transcendence: Wikipedia - Transcendence
Na época saiu até mesmo no site da globo.com, o que gerou muita dificuldade aos alunos que estavam fazendo tcc, já que houve um aperto em cima dos trabalhos apresentados por eles, além disso, curiosamente o campus mudou até de nome depois!
http://oglobo.globo.com/rio/cartaz-que-divulgava-evento-de-design-igual-peca-da-osesp-8529786
Eu o li, mas em seguida voltarei para estuda-lo. Um abraço!
Tenho acompanhado o seu trabalho e os artigos e eles seguem uma linha de pensamento que sigo. Parabéns!! Abraços e sucesso.
Um abraço.
Espero que os leitores do post vejam suas considerações.
Um abraço.